AGÊNCIA DC-NEWS

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Publicado em 15/06/2025 às 18:45

[AGÊNCIA DC NEWS]. Inaugurado há mais de 54 anos, em 24 de janeiro de 1971, o Minhocão teoricamente tem prazo para ser desativado: até 2029, conforme o Plano Diretor Estratégico (PDE, de 2014), do município de São Paulo (parcialmente revisado em 2023). Se o “quando” está definido, o “como” e o “o quê” seguem sem resposta. E, seja qual for a solução, precisa considerar não apenas a questão da mobilidade, mas aspectos urbanísticos e sociais. Deve abranger “uma solução para a cidade”, segundo Antônio Carlos Pela, coordenador do Conselho de Política Urbana (CPU) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que na quarta-feira (11) promoveu debate sobre o tema.

O evento teve três convidados. Sérgio Avelleda, ex-presidente do Metrô e da CPTM esteve na posição de mediador. Os outros dois participantes foram o arquiteto e urbanista Fernando Chucre, ex-secretário municipal das pastas de Desenvolvimento Urbano, Planejamento e Habitação, ex-presidente da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa), e Rafael Calabria, geógrafo e ex-coordenador de mobilidade urbana no Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). Não é um debate novo, mas continua inconcluso: o que fazer naquela área de 3,5 quilômetros de extensão, que liga o Centro à Zona Oeste? As propostas incluem demolição – total ou parcial – e criação de um parque na parte de cima do viaduto. Intervenções recentes da prefeitura (estacionamento, jardins de chuva) demonstram que a solução está distante.

Avelleda participou remotamente, da capital holandesa Amsterdã, cidade que frequentemente é citada como modelo de urbanismo. Mas ele disse, no entanto, que as transformações foram relativamente recentes. “Quarenta anos atrás, [Amsterdã] era absolutamente centrada no automóvel”, afirmou o também ex-secretário municipal de Mobilidade e Transportes. “Foi obrigada a se transformar por pressão da sociedade civil.” É o que acontece – ou precisa acontecer – em São Paulo. “Lei é pacto social. Temos um acordo”, disse Avelleda, se referindo ao prazo para desativação do Minhocão. Segundo ele, o debate parece limitado aos que querem tornar aquele espaço, e que as cidades são como organismos vivos. “A transformação é da sua essência.”

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Também presente no evento, no início da apresentação, a arquiteta Beatriz Messeder, que é coordenadora do CPU-ACSP, apresentou uma série de intervenções feitas em situações semelhantes, em cidades como Seul, Boston, Montreal, Amsterdã, Tóquio, Toronto e Buenos Aires. Além da Perimetral, no Rio de Janeiro, com a implosão do elevado, em 2013, que deu início a processo de revitalização da zona portuária. Chucre, no entanto, afirma que implodir o Minhocão é uma ação considerada inviável devido ao entorno de edifícios. Avaliação feita há aproximadamente dez anos estimou em R$ 130 milhões o custo da demolição. O ex-secretário acredita que esse valor seja duas vezes maior agora. “A gente não vai ter sucesso se não integrar todas as políticas públicas. E se não ouvir a sociedade”, afirmou. “É possível requalificar fazendo tudo de uma vez.” Medidas pontuais, disse, só representam gasto contínuo de recursos públicos.

Calabria, Antônio Pela (ACSP) e Chucre: automóveis ainda são prioridade
(Cesar Bruneli/ACSP)

MOBILIDADE Até hoje, todas as mudanças costumam ser feitas dando prioridade ao automóvel. Avelleda questionou: “Alguma vez o trânsito melhorou na nossa cidade?” Para ele, aumentar as vias se torna estímulo para que as pessoas comprem ainda mais carros. Calabria concordou. “As mudanças continuam pautadas pelo carro. Não mudou a matriz da mobilidade”, disse. Ele observou que existem várias alternativas de transporte na região: a Linha 3-Vermelha do Metrô, as linhas 7 e 8 da CPTM e o corredor da avenida São João.

Avelleda citou ainda outro corredor, na avenida Marquês de São Vicente. “San Francisco desativou uma estrutura parecida. E o trânsito não piorou”, disse Avelleda, que é sócio-fundador da Urucuia, empresa de assessoria em mobilidade urbana. “Ao retirar o espaço, eu não pioro o trânsito, porque desestimulo o uso [do automóvel] e promovo outros usos”, afirmou o advogado, que não dirige carro há dez anos. Ele diz que em São Paulo ainda existe o que chamou de “fetiche do automóvel”. Outra ação nesse sentido, disse ele, aconteceu em Nova York, onde a circulação de carros na Times Square, polo cultural e turístico da cidade, é proibida desde 2009. “Nova York não acordou e disse ao Bloomberg [o então prefeito, Michael Bloomberg]: vamos tirar os carros da Broadway, vamos fechar a Times Square”, disse. “Precisamos de lideranças que movam a agenda para a frente.”

Para o arquiteto e urbanista Valter Caldana, que participou da reunião promovida pelo CPU-ACSP, é “fundamental” que o Minhocão seja demolido integralmente, embora haja projetos “belíssimos” de manutenção de parte da estrutura (como aconteceu, por exemplo, em Tóquio). “Faça o que quiser em cima do Minhocão, não vai resolver embaixo. Nosso problema é o chão.” Pouco antes, Fernando Chucre havia dito que a parte sob o viaduto, onde também vivem pessoas em situação de rua, é o ponto mais poluído da cidade de São Paulo. Mas a parte superior é também área com bastante procura nos fins de semana – comparável, segundo ele, à visitação nos parques. Caldana falou ainda do aspecto econômico. “A iniciativa privada tem que fazer cidades além dos prédios”, afirmou. “Ou seja, deixando de lado a minha visão urbanista, é um enorme mau negócio manter o Minhocão.” Segundo ele, “O planejamento do comércio local é essencial”.

O Elevado João Goulart, nome oficial do Minhocão desde 2016 – até então, homenageava Costa e Silva, presidente na época do regime militar –, funciona como área de lazer de segunda a sexta-feira, das 20h às 22h, e aos sábados, domingos e feriados das 7h às 22h. A Lei 12.152, de 1996, fixou horários para circulação de veículos. Outra lei, de 2018 (16.833), determinava a criação do Parque Municipal do Minhocão e previa desativação gradual do elevado. No mesmo ano, um projeto de lei (PL 98) tratava do “desmonte” e requalificação da área. Em 2020, a Câmara aprovou o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 93, do ano anterior, para realizar uma consulta pública sobre o destino do elevado. O plebiscito não chegou a ser realizado. Pesquisa do instituto Datafolha, realizada também em 2020, mostrou que 54% dos entrevistados queriam a manutenção do Minhocão, enquanto 30% defendiam a construção de um parque e 7% eram favoráveis à demolição. O desafio é unificar propostas. E logo. Como disse o coordenador do CPU-ACSP, Antônio Carlos Pela, “2029 está aí”.