AGÊNCIA DC-NEWS

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Publicado em 13/06/2025 às 5:30

[AGÊNCIA DC NEWS]. Até esta sexta-feira (13), representantes de 187 países estarão reunidos em Genebra (Suíça) para a 113ª Conferência Internacional do Trabalho, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), entidade vinculada às Nações Unidas. O encontro ocorre no formato tripartite, com representantes de governos, empregadores e trabalhadores. E após a OIT revisar sua previsão para o emprego global neste ano: a estimativa caiu de 60 milhões para 53 milhões de postos de trabalho (de 1,7% para 1,5%). Isso em um planeta com 407 milhões de pessoas que gostariam de trabalhar, mas não conseguem. Reflexo, segundo a organização, de uma projeção rebaixada para o crescimento do PIB mundial – de 3,2% para 2,8%. A entidade estima que, em 71 países, aproximadamente 84 milhões de empregos estão, direta ou indiretamente, vinculados à demanda de consumo dos Estados Unidos. “Estes postos de trabalho, e os investimentos que geram, estão cada vez mais ameaçados pelo aumento das tensões comerciais”, afirmou a OIT.

Outro tema de destaque no evento é o impacto da inteligência artificial na economia. Em estudo divulgado ainda antes da 113ª Conferência Internacional do Trabalho, a OIT afirma que 25% do emprego mundial está em “ocupações potencialmente expostas” à IA, chegando a 34% em países com investimentos mais elevados. Nesses países, os empregos com maior possibilidade de automatização representam 9,6% da ocupação feminina, ante 3,5% entre os homens. O vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Ivo Dall’Acqua Júnior, que participa do encontro, acredita que o caminho passa pela capacitação, e não pela substituição da mão de obra. “No varejo em particular, a ferramenta tem contribuído para a eficiência operacional e para a melhoria da experiência do cliente”, afirmou, em entrevista à AGÊNCIA DC NEWS.

A situação – da economia em geral e do mundo do trabalho em particular – é desafiadora no Brasil, segundo o vice-presidente da FecomercioSP. Para o executivo, a economia ainda se mostra “resiliente”, dada a recuperação pós-pandemia e a geração de empregos, “mas já são perceptíveis os sinais de desaceleração”. “Há problemas estruturais, principalmente no campo fiscal”, disse. Caso essas questões não sejam solucionadas, será difícil manter a “sustentabilidade e o crescimento do emprego em médio e longo prazos”. Dall’Acqua Júnior diz que gastos públicos excessivos e disposição reduzida para implementar reformas minam a confiança do mercado. Ele cita a Reforma Trabalhista implementada em 2017, que considera um avanço, mas que pode ser aprimorada.

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O delegado patronal do evento da OIT é Antonio Ricardo Alvarez Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Pelos empregados, Lourenço do Prado (UGT). Pelo governo, o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho. O vice-presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Ivo Dall’Acqua Júnior, também participa dos debates sobre o futuro do trabalho e as transformações tecnológicas, temas recorrentes na conferência.

Na abertura da conferência, o diretor-geral da OIT, Gilbert F. Houngbo (ex-primeiro-ministro de Togo), disse que a função da organização é mais relevante do que nunca. “Isso inclui não apenas o desenvolvimento, a implementação e supervisão de normas internacionais do trabalho”, afirmou. “Mas também a necessidade urgente de garantir condições equitativas em uma economia global cada vez mais interconectada e em transformação.”

Confira a entrevista exclusiva do vice-presidente da Fecomércio à AGÊNCIA DC NEWS:

AGÊNCIA DC NEWS – Na abertura da conferência, o diretor-geral da OIT disse que é possível promover a justiça social por meio do melhor equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental. O senhor acha que estamos longe desse equilíbrio?
IVO DALL’ACQUA JÚNIOR – A busca por esse equilíbrio é constante. Pela dinâmica atual da conjuntura mundial, considerando as causas e consequências das mudanças climáticas, a digitalização da economia e as oscilações no campo das relações internacionais, é papel de organismos como a OIT discutir e propor alternativas focadas em um contexto socioeconômico mais harmônico.

AGÊNCIA DC NEWS – E no Brasil?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – No caso do Brasil, sem o enfrentamento, por parte dos governos e da sociedade, das questões estruturais que influenciam o crescimento do país, não será possível avançar nessa busca por equilíbrio.

Ivo Dall’Acqua Júnior: “Problemas estruturais comprometem sustentabilidade”
(Edilson Dias/FecomercioSP)

AGÊNCIA DC NEWS – A OIT reduziu em 7 milhões a projeção para a criação de empregos, em um ambiente de crescente incerteza global. O Fundo Monetário Internacional (FMI) também reduziu a estimativa para o crescimento da economia…
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Falando especificamente do Brasil, a situação é desafiadora. A economia ainda se mostra resiliente, com efeitos positivos da recuperação pós-pandemia e com capacidade de gerar empregos, mas já são perceptíveis os sinais de desaceleração. Há problemas estruturais, principalmente no campo fiscal – que, se não solucionados, dificultarão a sustentabilidade e o crescimento do emprego em médio e longo prazos. A propósito, o cenário fiscal deve ser encarado como um instrumento para promover a justiça social e o equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental nacionais.

AGÊNCIA DC NEWS – Quais os desafios?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Os gastos excessivos dos governos e a baixa disposição para trabalhar uma agenda de reformas fragilizam a confiança do mercado, exigindo que a política monetária seja mais restritiva. O resultado é uma dificuldade para controlar a inflação e um ambiente de negócios incerto, com empresas cautelosas quanto a investir e contratar. Isso, somado a uma inflação persistente, juros elevados, crédito mais caro e alto endividamento das famílias, também reduz o consumo da população, levando, consequentemente, a uma menor oferta de emprego.

OIT
Houngbo, diretor-geral da OIT: “Condições equilibradas em uma economia global”
(Divulgação/OIT)

AGÊNCIA DC NEWS – O país enfrenta problemas com a mão de obra?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Frente a toda essa conjuntura e projeções mais modestas da OIT e do FMI, o mercado de trabalho brasileiro está lidando com impasses qualitativos relevantes em 2025. Os índices são importantes e balizam decisões, mas é necessário também olhar a produtividade e a qualidade dos postos de trabalho. O gap de mão obra é prova cabal disso. Além disso, se olharmos somente para os números de ocupação, teremos uma base de comparação do ano passado sustentada por fatores frágeis, como consumo alto estimulado pelo crédito, inflação pressionada, déficit externo crescente e investimento fraco.

AGÊNCIA DC NEWS – Em outro estudo, a OIT afirma que um em cada quatro postos de trabalho está em risco por causa da inteligência artificial (IA). Como o comércio está se preparando para essas transformações?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Acredito que um dos caminhos para tratar do impacto da IA sobre o mercado de trabalho seja a capacitação humana, e não a sua substituição. O saber humano continua sendo essencial, e a IA deve potencializar a demanda por profissionais críticos, capazes de trabalhar em conjunto com essa tecnologia. No varejo em particular, a ferramenta tem contribuído para a eficiência operacional e para a melhoria da experiência do cliente, por meio da personalização de ofertas com base no comportamento e no histórico de compras, da automação de processos e atendimentos e da otimização da gestão de estoques com previsão de demanda, evitando tanto a falta quanto o excesso de produtos.

AGÊNCIA DC NEWS – Qual a saída, então?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Especialistas indicam que a economia dessa tecnologia representa uma das maiores janelas de oportunidade da nossa geração – e o setor produtivo precisa acompanhar esse processo. No comércio, o esforço está voltado para a inclusão dos trabalhadores nessa nova economia. Por isso, a FecomercioSP defende que as Pequenas e Médias Empresas (PMEs) contem com programas de capacitação, além de mecanismos de crédito e financiamento diferenciados, tanto para a adoção da ferramenta quanto para a qualificação – ou requalificação – dos colaboradores, que serão centrais para a competitividade das organizações brasileiras. Por fim, os debates sobre regulação devem buscar o equilíbrio entre a redução de riscos e a continuidade do avanço tecnológico, gerando benefícios tanto para o mercado quanto para a sociedade.

AGÊNCIA DC NEWS – O Brasil, pelo menos até agora, continua criando empregos, inclusive formais, com taxa de desemprego no menor nível histórico e renda em alta. O senhor acredita que esse movimento vai continuar ou vai arrefecer?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – O mercado de trabalho formal já mostra desaceleração. Ao compararmos a geração de empregos com carteira assinada no primeiro quadrimestre deste ano com o mesmo período do ano passado, observaremos que há uma queda de 4,5% no saldo de vagas. Olhando para os cinco grandes setores, apenas a Agropecuária gerou mais postos de trabalho do que no ano passado, e os dados do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre divulgados recentemente reforçam o crescimento acelerado do setor. Assim, já há uma evidente desaceleração, fato natural e esperado, considerando a forte base de comparação e o ciclo de alta da Selic.

AGÊNCIA DC NEWS – E no comércio?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Essa diminuição no ritmo foi menor na indústria e na construção. No entanto, no comércio, chama a atenção a queda de 24% na geração de vagas. Foram quase 48 mil postos abertos nos primeiros quatro meses de 2024, contra 36,5 mil neste ano [segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged)]. Embora esse quadro ainda seja positivo, a FecomercioSP vem alertando que o setor está trabalhando com margens apertadas e baixa rentabilidade – e os dados de recuperação judicial e falências confirmam esse diagnóstico.

AGÊNCIA DC NEWS – Efeito dos juros?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Aquela empresa que contraiu um empréstimo pelo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) durante a pandemia – para manter as portas abertas – segue pagando as parcelas, as quais vão ficando mais caras à medida que a Selic aumenta, afetando os resultados do negócio. Esse é apenas um exemplo das adversidades enfrentadas pelas empresas e que acabam afetando a sua capacidade de abrir novas vagas.

AGÊNCIA DC NEWS – A Reforma Trabalhista vai completar oito anos. As medidas chegaram a ser questionadas na própria OIT. O setor empresarial considera que foi bem-sucedida ou seria necessária uma ampliação?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – A Reforma Trabalhista foi um avanço na modernização da relação entre capital e trabalho e, sim, pode ser aprimorada, com a ampliação da sua aplicação. No entanto, o principal entrave à sua efetividade não está na reforma em si, mas na instabilidade das decisões judiciais, que têm gerado insegurança jurídica.

AGÊNCIA DC NEWS – O Judiciário é um entrave?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – Um estudo elaborado pelo Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP ajuda a exemplificar melhor o que está acontecendo. Muitas sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho, embora bem-intencionadas, acabam desestimulando a atividade empresarial ao se basearem em interpretações da legislação desalinhadas do objetivo de modernizar as leis laborais proposto pela reforma. O Brasil ainda está longe de contar com decisões judiciais que respeitem rigorosamente as leis vigentes. Pelo contrário, há uma abundância de decisões que se afastam da legislação – e, muitas vezes, até mesmo da própria Constituição de 1988.

AGÊNCIA DC NEWS – O que fazer em relação a isso?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – E como ficam a geração de empregos e a economia nesse contexto? É importante lembrar que ambas estão diretamente ligadas às decisões empresariais de investimento, que dependem da disponibilidade de caixa, da saúde financeira dos negócios e, acima de tudo, da confiança econômica. O estudo demonstrou que o impacto da insegurança jurídica sobre a área Trabalhista é substancial e complexo, evidenciando os custos gerados por decisões judiciais que se distanciam da legislação.

AGÊNCIA DC NEWS – As relações de trabalho evoluíram no Brasil ou a negociação coletiva ainda é pouco valorizada?
IVO DALLACQUA JÚNIOR – A negociação coletiva, em toda a sua amplitude de possibilidades para ambas as partes, é um instrumento valioso, especialmente diante de uma realidade de transformações cada vez mais intensas no mundo laboral. Trata-se de um instrumento moderno e efetivo de mediação entre empregadores e trabalhadores, pois é flexível e permite adaptações às diferentes realidades dos segmentos econômicos, atendendo às especificidades das jornadas e das condições de trabalho. Fortalecer o diálogo entre as partes torna as relações laborais mais equilibradas e proporciona mais segurança jurídica. Por isso, é fundamental estimular esse mecanismo e ampliar a sua utilização.